sábado, 12 de setembro de 2009

Dia 4 - 26 de Agosto 2009
Ilha de Taquile - Titicaca 

7 horas da manhã - hora de despertar, que normalmente seria uma tortura aqui se torna normal, afinal durmo no máximo às 9 da noite, totalmente vencida pelo cansaço.  Almoçamos o café da manhã e descemos a respiração fica ofegante, descer ainda é fácil a grande confusão é qdo tenho que subir. 
Vou ter uma demonstração dos alimentos ali produzidos e de como eles processam a lã, incluindo, morram de inveja, tingimento natural.
Tudo super arrumado, preparado para me receber, me sinto uma rainha, com direito a 1 mulher fiando, 1 tecendo em tear, barracas com produtos artesanais para venda, o Sr. Alípio e seu sogro Sr. Isidoro ( mestre de tricot na escola local), produtos agrícolas, moinho de pedra, plantas locais, que mais eu poderia querer neste momento.
 
Eles lavam a lã de carneiro ou alpaca com um cacto que cresce por toda a ilha, ele é moído em um moinho de pedra, adiciona água fria coloca a lã e chacoalha, não é que a danada fica limpa, sem o fedor do carneiro e com a lanolina, é um sabão natural, usam também nas roupas, corpo, adoreiiiiiiiiiiiiii. 
O tingimento é feito com plantas, moída ou ralada, água quente, ferve por uns 30 minutos e pronto, o tingimento acabou, o interessante é que de fato funciona, tem solidez ao sol, e a lavagem, tenho uns chullos que estão comigo há uns 15 anos, já lavei varias vezes e a cor continua a mesma. Um aprendizado muito legal, mas que não é viável por aqui - imagina sair catando planta na cidade, ou 
 plantar no apto! Acabo arrumando uma confusão tão grande com o marido que já teve uma parte do apartamento invadida com as minhas poucas coisinhas
Estou agitada animada, compro uns chullos tradicionais, bem caros se comparados a outros, mas são para referencia, tenho que olhar o direito e o avesso pra poder me lembrar do que o Sr Isidoro foi me falando, os desenhos são lindos e bem coloridos, mas tem uma delicadeza complicada de entender, só mesmo tecendo uma vida pra conseguir este equilíbrio. É impressionante ver os homens tecendo e conversando, o fio fica no pescoço, uma cor de cada lado, não tencionam com a mão, ele fica solto e o cara vai tricotando os desenhos, as vezes mais de um na mesma carreira, me coloquei uma meta pra este ano, vou treinar as minhas mãos e aprender a tecer jackard direito, o estimulo já foi dado, agora é treino.
 Meio dia – pontualmente a hora do almoço, hj temos truta, arroz e batata, além da sopa, eu adoro sopa, qdo criança na casa da minha avó tinha sopa no almoço e no jantar, todos os dias, me reconforta. Depois do almoço um descanso merecido, do lado de fora da casa rodeada por kantutas coloridas olhando o lago, coisa boa, a digestão fica fácil e feliz.
O tempo passa vagarosamente, o ar é diferente, frio, leve e sem cheiro. Não existe barulho é como se fosse possível ouvir o silencio. Ficar olhando e ver o céu refletido no azul do lago, às vezes um burro urra, uma sensação de paz vai invadindo a alma é um prazer imenso poder desfrutar esta experiência, ela é olfativa, visual, sensorial, mas principalmente espiritual.
 
Hora de subir um apu ( montanha ), aqui elas são sagradas, vamos para um bem alto, umas 5 ou 6 pessoas, elas vão caminhando bem rápido e a subida é bem íngreme e claro cheia de pedras, uma caminhada de uns 40 minutos pra mim, chego morta... nos sentamos em umas pedras bem na beirada do morro, olha ai o medo de cair, meu lugar é ao lado do mestre que vai me ditando o que devo tecer, tecem pelo lado do avesso, tudo em tricô, sempre com 5 agulhas, muito finas, diferente das nossas, um lado com ponta de crochê o outro com ponta de tricot, tentei comprar mas não consegui, vou pegar umas de tunisiano e transformar, quero tentar com elas, o Isidoro jura que fica muito mais fácil. Como ele está acostumado a ensinar crianças não tenho problema em fazer o que ele pede, ele dita e eu faço, sem complicação, claro que o avesso bem feito é tão importante como o direito, uma questão de orgulho saber tricotar com perfeição.
Uma foto do Sr Isidoro e suas agulhas, ele tem orgulho do seu oficio, da sua nacionalidade, das tradições do seu povo e principalmente da sua família, isso me faz pensar somos tão      “civilizados“ e os nossos valores fundamentais? Como andam? A simplicidade em querer uma casa de adobe num monte super alto, onde vc tem que subir a pé numa altitude de 4 mil metros, num clima onde o vento dos Andes começa as 5 da tarde e ai tudo gela, onde a água é carregada, sem aquecimento, a eletricidade é gerada por painéis solares, é tão menos conforto do que temos e me parece que são muito mais equilibrados e tranqüilos. Será que nos somos mesmo tão civilizados? Que somos mais felizes por abrir a torneira e a água sair quente? O Alípio é o alcaide rural de Taquile, o mandato é de um ano, elenão recebe salário por isto, controla a agricultura da ilha e por isso recebe na colheita 1 kilo de alimento de cada morador, para ele é um privilegio ser o alcaide, penso que eu fugiria deste cargo achando que só me traria trabalho e transtorno.


Ai esta o pq desta viagem, refletir sobre a vida, redefinir valores, sentimentos, emoções, alguma coisa a resgatar... De alguma maneira eu senti que precisava estar aqui, embora o momento não fosse o ideal, mas acertei na decisão, eu estava precisando muito desta vivencia.
 ABAIXO UM LINK QUE FALA SOBRE OS TECIDOS DE TAQUILE


ILHA DE TAQUILE - TEAR E TRICOT  

O dia vai pasando e tenho que ir embora, a lancha tem hora certa pra sair. 


Vai chegando a hora de voltar a Puno, tomar um banho, coisa que nao faço tem 4 dias, à noite a guia Ana vai me pegar no hotel e levar pra buscar as meninas no aeroporto de Juliaca, 1 hora de carro, o cair da tarde mostra que a noite vai ser bem fria, a viagem se São Paulo até Puno é muito cansativa, horas em Lima esperando a hora de embarcar. 
Sinto ter que ir embora, ficaria por aqui mais um tempo, ando precisando da paz que encontrei. 
3 horas na lancha e vamos chegando a Puno, totora por todo lado, aqui o lago é poluido, mas não deixa de ser belo.
8 da noite - banho tomado, cabeça lavada, perfume, casaco amarelo contra o frio ( a pati detesta este casaco) estou ansiosa com a chegada, elas não saem nunca, aqui se abre mala toda hora, tem alguma coisa de terrorismo voltando então a revista é bem rigorosa. Finalmente elas aparecem, cansadas e felizes, abraço a pati como se não a visse há muito tempo.
Esta noite vamos fazer uma oferenda a Pacha Mama e ler folhas de coca.

2 comentários:

Mariângela disse...

Rubia ! Estou encantada com sua viagem, menina...enrriquecedora!!!
Gostaria de poder estar junto, uma aventura incrivel, hem?
Bjs!

Norimar disse...

Rubia, ler seu relato de viagem é como estar assistindo a um filme, muito bom!!1 Norimar